Desde a sanção da nova lei de agrotóxicos, em dezembro deste ano, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) assumiu papel central na gestão de registros desses produtos. Essa alteração, porém, gerou dúvidas sobre a continuidade das funções de órgãos como o Ibama e a Anvisa.
O novo arranjo deixou os órgãos ambientais e de saúde em um estado de incerteza, uma vez que as atribuições ainda dependem de regulamentação clara.
A urgência na tramitação da lei, conduzida pela senadora ruralista Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro, trouxe à tona a necessidade de regulamentação para definir com precisão os papéis de Anvisa e Ibama.
Atualmente, os órgãos continuam operando sob normas de 2002, mas a nova estrutura pode enfraquecer suas funções, gerando preocupações sobre a integridade dos processos de análise e controle de substâncias químicas.
Vácuo regulatório e responsabilidade do Mapa
O Sistema Integrado de Agrotóxicos (SIA) foi criado pelo governo para centralizar pedidos de registro, mas ainda aguarda implementação. Enquanto isso, Anvisa e Ibama mantêm suas análises, mas sem a autoridade de conceder registros.
Apesar das preocupações, o Mapa garantiu que a transparência será mantida nos processos de análise, apesar da nova centralização.
A incerteza sobre as competências futuras gera preocupação nos órgãos. A Anvisa, que realiza o monitoramento de resíduos em alimentos, assegura a continuidade de suas operações, mas alerta para a possibilidade de reavaliações serem tratadas como recomendações pelo Mapa.
Durante anos, o Mapa buscou criar programas próprios, como o Programa Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em Produtos de Origem Vegetal (PNCRC/Vegetal), com menor abrangência que os da Anvisa. Essas iniciativas podem comprometer a efetividade dos controles ao reduzir o escopo das análises químicas.
Como há menos substâncias testadas no programa, muitos alimentos recebem o resultado de estarem livres de agrotóxicos. São falsos negativos, pois pode haver resíduos de outros produtos que não foram testados”, explica Luiz Cláudio Meirelles, pesquisador da Fiocruz.
Debates e papel da sociedade civil
Entre abril de 2023 e junho de 2024, o Mapa e a Anvisa participaram de ao menos sete reuniões com a indústria para discutir regulamentações, enquanto o Ibama esteve ausente desses encontros. A ausência da sociedade civil nas discussões levanta questões sobre a influência da indústria nas decisões finais.
A centralização no mapa e a falta de diretrizes claras despertaram críticas. A sociedade civil, representada por diversas organizações, planeja ações judiciais para desafiar a nova lei, cujo objetivo é restaurar o equilíbrio entre interesses econômicos e a proteção à saúde e meio ambiente.
Especialistas e ativistas esperam que o Supremo Tribunal Federal avalie os dispositivos da lei, potencialmente restabelecendo competências aos órgãos de saúde e meio ambiente. Enquanto isso, a extensa disputa legislativa evidencia a complexidade e a importância de uma regulamentação ponderada e eficaz.